Diz um velho ditado que o que os olhos não veem, o coração não sente...
Pura mentira, fantasia e pensamento obsoleto de pessoas materialistas e sem emoção. Sem noção da realidade de dentro do mar.
Pelo menos, essa foi a conclusão a que cheguei no último domingo, 13 de fevereiro, 2011, em Quintão, entre 09 horas e 12 horas e um pouco mais, pelas bandas do oceano.
O clássico dos clássicos; daqueles para não ser esquecido por muito tempo... ou melhor, para ser lembrado por muitos e muitos tempos. Como eu disse para um dos brothers (e esse perdeu o clássico) no final daquele domingo, só não foi um épico, talvez, pela ausência do sol; porém, mero detalhe para quem sentiu na espinha as ondas perfeitas que quebraram naquele dia.
Para quem sentiu, mesmo sem ver.
Após um sábado chuvoso e de ondas a desejar, eramos seis amigos, irmãos de água (de sal!) em um mar liso, levemente de sul, com ondas de pouco menos de um metro a maiores, com certeza acima de "um conto" de face, moldadas por um vento terral definido, quebrando em uma bancada que parecia ter se formado sob encomenda para aquele dia.
Eramos seis, que, a cada onda desbravada e vencida, vibravamos, alucinados, no mais puro êxtase do soul surf. Sem competição, sem atucanação; apenas pela felicidade de estarmos juntos pegando mais um clássico nas nossas vidas. Mas todo clássico, nunca é apenas "mais um clássico", e sim, O Clássico.
O Clássico dos berros, de como se a vida fosse uma só.
É difícil descrever a adrenalina, a emoção e a energia que se sente quando se pega ondas como aquelas, perfeitas, que vinham encorpadas e ficavam "em pé" na hora certa, tabulares, quebrando para os dois lados. Impossível descrever para quem não as vê, não as busca... Mas para nós que estivemos dentro do mar, naquele domingo de manhã... ainda hoje, um dia, dois dias depois, ainda é possível sentir aquela sensação suprema do mais alto nível do nosso estado de espírito.
Falo por mim, mas tenho certeza que quem esteve lá comigo teve o mesmo sentimento.
O sentimento de estar cuidando a linha do horizonte, a ondulação alinhada que chegava até a arrebentação e, de repente, sentir a alma arrepiar só em escutar o berro mais emocionado da vida de um de seus amigos ao sair de mais uma onda perfeita e alucinante que aquele mar de Quintão, em mais um domingo de verão, proporcionou.
Prova de que o coração sente, sim, até aquilo que não vê.
O coração escuta; desde a formação da onda, até a braçada do surfista na remada do drop, até a saída do surfista da sessão final da onda.
Dizer para um surfista que o que os olhos não veem, o coração não sente, é a maior mentira que se pode inventar; é tentar enganar a luz com um espelho.
A cada surfada naquela manhã de domingo mágica, vibravamos, intensamente, mesmo que a emoção do amigo chegasse até nós apenas pelo som, o seu berro pelos nossos ouvidos. Não era preciso vê-lo na vala; o grito, a adrenalina e a harmonia do momento eram expressas apenas pelo som, acusando mais uma onda única.
Como se a vida fosse uma só (e, talvez, realmente seja), colocamos para baixo, sem medo do amanhã, e estabelecemos a cada um de nós que estava lá dentro que, sim, o que os olhos não veem, o coração pode sim sentir.
E assim como ocorreu por várias vezes naquele dia, aqui se dará de forma igual. Como registro, apenas uma abençoada foto que, por "acaso", resolvemos tirar antes de ir para o mar... talvez prevendo o que viria pela frente. Não ficaram registros fotográficos ou vídeos do mar daquele dia, das ondas que pegamos, apenas o sentimento de quem esteve lá dentro, de quem surfou, viu, escutou outro alguém pegando o.clássico do último 13 de fevereiro.